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Chapter 4 - Capítulo 4: Ecos da Guerra

Pedra memorial, Nomes gravados no frio, Vento chora ali.

Konoha respirava um ar de normalidade forçada, uma fachada cuidadosamente mantida sobre feridas ainda abertas. As pessoas iam e vinham pelas ruas poeirentas, suas sandálias levantando nuvens finas de pó sob o sol pálido. O mercado fervilhava com sua cacofonia habitual de pregões, barganhas e conversas abafadas. As crianças corriam e gritavam em suas brincadeiras barulhentas, alheias ou talvez apenas acostumadas à tensão subjacente. Mas por baixo dessa superfície de cotidiano recuperado, as cicatrizes da Segunda Grande Guerra Shinobi eram onipresentes, uma tapeçaria sombria tecida na própria estrutura da vila, visíveis para quem estivesse disposto a olhar – ou, no meu caso, para quem possuísse a maldição de uma perspectiva externa, incapaz de ignorar as dissonâncias com um mundo que lembrava ser fundamentalmente diferente.

Comecei a percebê-las nos detalhes, como fissuras em uma porcelana antigo. Havia áreas inteiras da vila, especialmente nos distritos mais periféricos, onde a reconstrução ainda estava em andamento, anos após o fim oficial do conflito. Esqueletos de edifícios, com vigas de madeira carbonizadas apontando para o céu como dedos acusadores, erguiam-se ao lado de casas recém-consertadas, um testemunho silencioso e constante da destruição que varrera a vila. O ritmo do trabalho era lento, metódico, quase doloroso de observar; os recursos, eu suspeitava com minha mente analítica, eram escassos no pós-guerra, desviados talvez para o rearmamento silencioso ou para a manutenção da frágil paz. Via homens e mulheres, civis na maioria, trabalhando lado a lado com alguns shinobi de baixo escalão – talvez aqueles considerados inaptos para missões mais perigosas? – em tarefas árduas de carpintaria e alvenaria, seus rostos marcados pelo esforço físico, pela poeira e por uma determinação resignada.

Mas as cicatrizes mais profundas, aquelas que realmente me assombravam, não estavam nas construções, e sim nas pessoas. Comecei a notar os veteranos, figuras que se destacavam não por seus uniformes, mas pelas marcas indeléveis que o conflito havia deixado em seus corpos e almas. Homens e mulheres, alguns surpreendentemente jovens – não muito mais velhos que a minha idade na vida anterior – que se moviam com uma rigidez incomum, uma cautela que não condizia com a aparente tranquilidade das ruas. Um homem que mancava visivelmente, apoiando-se pesadamente em uma bengala improvisada enquanto varria a frente de sua pequena loja de chá, seu olhar perdido em algum ponto distante. Uma mulher com um tapa-olho de couro escuro que vendia flores murchas no mercado, seu sorriso forçado nunca alcançando totalmente o olho restante, que parecia conter uma tempestade de memórias. Um senhor idoso sentado invariavelmente no mesmo banco na praça, a manga de seu kimono simples dobrada e presa sobre um braço que não existia mais, olhando para o vazio com olhos que pareciam ter visto o inferno e retornado, mas deixado uma parte de si para trás.

E as cicatrizes invisíveis... essas eram ainda mais penetrantes, mais perturbadoras. Percebia-as nas conversas sussurradas entre adultos, que cessavam abruptamente, como um rádio desligado, sempre que eu ou outra criança nos aproximávamos demais. Captava fragmentos de frases, palavras carregadas de um peso que eu só podia imaginar: "...a fronteira com Amegakure...", "...perdas terríveis na última campanha...", "...o sacrifício do time Jiraiya...", "...aquele jutsu proibido de Iwa...". Ouvi-as na forma como as pessoas se sobressaltavam com ruídos altos e inesperados – o bater de uma porta, um trovão distante, o grito mais agudo de uma criança brincando – seus corpos reagindo com um espasmo de medo aprendido, um eco nervoso da violência que tinham suportado e que, talvez, esperavam a qualquer momento retornar.

Via essas cicatrizes nos olhos de Sanae, especialmente nos momentos de quietude. Quando ela ficava parada por longos instantes, talvez após retornar de uma visita ao mercado ou enquanto remendava roupas à luz fraca da lamparina, olhando para um ponto fixo na parede, sua expressão se tornava distante, velada por uma dor que transcendia o cansaço do dia a dia. Era um luto silencioso, constante, por perdas que eu nunca conheceria, mas cuja profundidade eu podia sentir na atmosfera pesada da pequena casa.

Este mundo, que nas páginas do mangá parecia tão focado em aventuras emocionantes, rivalidades intensas e batalhas épicas, revelava-se em sua realidade cotidiana como um lugar profundamente marcado pela perda, pela dor crônica e por uma resiliência sombria, forjada na fornalha da adversidade constante. A fantasia estava se desfazendo rapidamente, camada por camada, substituída por uma compreensão crua e desconfortável da verdadeira natureza da vida shinobi e de suas consequências devastadoras para todos, combatentes e civis.

Em um desses dias de crescente e incômoda percepção, Sanae me levou a um lugar novo, diferente de nossas rotas habituais. Não era o mercado movimentado ou as ruas familiares ao redor de nossa casa. Seguimos por um caminho mais silencioso, afastando-nos do centro do distrito, por uma trilha cercada por árvores altas e antigas, cujas raízes retorcidas pareciam garras agarrando a terra. O ar tornou-se mais fresco, carregado com o cheiro de terra úmida e folhas em decomposição. Chegamos a um pequeno complexo de edifícios de madeira escura, com telhados curvos e graciosos cobertos de musgo, e uma atmosfera de serenidade austera que contrastava fortemente com a tensão velada do resto da vila. Um templo.

Não era grandioso ou imponente como os templos famosos que eu lembrava de minha vida passada. Era simples, discreto, quase se misturando à floresta circundante, como se tivesse brotado naturalmente da terra. O ar aqui parecia mais leve, mais limpo, com um aroma penetrante de incenso misturado ao resinoso perfume do pinho. O silêncio era profundo, quebrado apenas pelo canto intermitente dos pássaros escondidos na folhagem e pelo som suave e constante de um pequeno riacho que corria ali perto, sua água límpida deslizando sobre pedras lisas.

Sanae me guiou para dentro do pátio principal, um espaço amplo e varrido, coberto por cascalho fino que rangia suavemente sob nossos pés. Havia algumas lanternas de pedra antigas, cobertas de musgo verde-escuro, um pequeno sino de bronze pendurado sob o beiral do telhado do salão principal, e, no centro, um jardim de pedras cuidadosamente arranjado – rochas de formas e tamanhos variados dispostas sobre areia branca rastelada em padrões ondulantes. Algumas poucas pessoas estavam presentes, movendo-se com uma quietude reverente: um monge idoso varrendo as folhas caídas com movimentos lentos e deliberados, como uma meditação em ação; uma senhora idosa ajoelhada em frente ao salão principal, suas mãos unidas em prece, seus lábios movendo-se silenciosamente.

Senti uma estranha mistura de familiaridade e estranhamento. A arquitetura, a atmosfera de contemplação silenciosa... algo ressoava com minhas memórias de visitas a templos budistas ou xintoístas em minha vida passada. Mas a sensação era diferente aqui. Havia uma camada subjacente de melancolia, uma quietude que parecia nascida não apenas da paz espiritual, mas também do luto compartilhado, da memória coletiva da perda.

Sanae me conduziu, sua mão segurando a minha com uma firmeza gentil, até um canto mais afastado do pátio, parcialmente sombreado por um grande bordo cujas folhas começavam a adquirir tons avermelhados. Ali, erguia-se uma estrutura simples, mas de impacto inegável: uma grande pedra negra, de superfície lisa e polida pelo tempo e talvez pelas lágrimas, com nomes gravados em fileiras densas e intermináveis. Um memorial. Não o grande Memorial dos Heróis com a chama acesa que eu lembrava das histórias, mas algo menor, talvez mais antigo, talvez dedicado a um clã específico ou às vítimas de uma batalha particular. Os nomes eram tantos... fileiras e mais fileiras cobrindo cada centímetro da superfície fria da pedra.

Sanae ficou ali parada por um longo momento, a cabeça baixa, seus ombros curvados sob um peso invisível. Seus lábios se moviam silenciosamente, talvez recitando os nomes que conhecia, talvez oferecendo uma prece por almas perdidas. Eu observei, sentindo um peso físico se instalar em meu peito, dificultando a respiração. Não precisava entender a língua para compreender o significado profundo e doloroso daquele lugar. Era um repositório de perdas, um testemunho reverente e imutável dos custos exorbitantes da guerra e da própria existência shinobi.

Quantos nomes? Centenas? Milhares? A escala do sacrifício era avassaladora, quase inconcebível. Cada nome ali representava uma vida interrompida, uma história terminada abruptamente. Alguém que tinha amado e sido amado, alguém com sonhos, medos, esperanças e arrependimentos. Alguém cuja ausência deixara um vazio irreparável no tecido da vila, na vida de pessoas como Sanae. E esta era apenas uma pedra memorial, em um canto tranquilo de um templo local. Quantas outras existiriam? Quão vasta era realmente a extensão da carnificina?

Minha mente, treinada em lógica e análise, tentava processar a informação em termos de estatísticas, de história militar, de consequências políticas. Mas era o meu coração – ou talvez minha alma envelhecida aprisionada neste pequeno corpo– que absorvia o impacto visceral. A natureza violenta deste mundo não era uma abstração literária, não era apenas um pano de fundo para aventuras emocionantes. Era uma força real, tangível e devoradora que moldava cada aspecto da vida aqui, desde a arquitetura das casas até a tristeza nos olhos das pessoas. A paz, percebi com uma clareza desoladora, era apenas um frágil interlúdio, uma pausa para lamber as feridas e enterrar os mortos antes que o ciclo vicioso do conflito recomeçasse inevitavelmente.

Lembrei-me vividamente das crianças brincando de ninja no mercado, seus gritos alegres ecoando em minha mente com uma ironia cruel. Sua inocência agora parecia ainda mais frágil, quase trágica. Elas cresceriam neste mundo, seriam doutrinadas pela "Vontade do Fogo", treinadas para lutar, para matar, para talvez, um dia, terem seus próprios nomes gravados em uma pedra fria como esta, tornando-se apenas mais uma linha em um memorial esquecido.

Senti uma onda de náusea subir pela garganta. Era demais. A justaposição das minhas memórias de um mundo relativamente seguro, onde a guerra era algo distante e televisionado, com esta realidade brutal e onipresente era quase insuportável. Por que aqui? Por que eu? Havia algum propósito cósmico nisso, alguma lição a ser aprendida, ou era apenas um acaso cruel do destino, um erro aleatório na tapeçaria do universo?

Busquei algum consolo na serenidade aparente do templo, na beleza austera do jardim de pedras, no cheiro calmante do incenso que flutuava no ar. Mas a paz do lugar parecia superficial, uma camada fina de verniz sobre uma madeira podre, incapaz de penetrar a angústia existencial que me consumia. Era como colocar um curativo limpo sobre uma ferida profunda e infeccionada.

Sanae finalmente se moveu, seu suspiro quase inaudível quebrando o silêncio. Ela tocou meu ombro gentilmente. Seus olhos encontraram os meus, e por um instante fugaz, vi uma compreensão profunda ali, uma empatia que transcendia as palavras. Ela não sabia da minha vida passada, da minha verdadeira identidade presa neste corpo infantil, mas talvez reconhecesse a sombra que pairava sobre mim, a mesma sombra escura que tocava a todos naquela vila marcada pela guerra, a sombra da perda e do medo.

Ela não disse nada, o que talvez fosse melhor. Palavras pareceriam vazias diante da magnitude silenciosa daquela pedra. Apenas pegou minha mão novamente, seus dedos calejados envolvendo os meus com uma força surpreendente, e me guiou para fora do pátio do memorial, de volta ao caminho sombreado pelas árvores antigas. A falta de palavras na caminhada de volta era pesado, denso, mas não desconfortável. Era uma quietude de reconhecimento mútuo, uma aceitação tácita da dor que permeava o próprio ar de Konoha, tão palpável quanto o cheiro de pinho e terra úmida.

Naquele dia, algo fundamental mudou em minha perspectiva. O medo primordial ainda estava lá, a confusão existencial também. Mas a eles se juntou uma nova camada de compreensão, mais sombria, mais complexa e mais resignada. Este mundo não era apenas perigoso em um sentido físico; era fundamentalmente trágico em sua própria essência. E sobreviver aqui não significaria apenas aprender a lutar, a dominar jutsus e estratégias. Significaria aprender a viver com o peso esmagador dessa tragédia, a encontrar algum sentido, alguma razão para continuar, em meio à violência cíclica e à perda onipresente.

A visita ao templo não ofereceu as respostas fáceis que eu talvez buscasse inconscientemente, mas solidificou as perguntas que realmente importavam. Qual era o verdadeiro valor da vida em um mundo tão propenso a tirá-la de forma tão casual e brutal? Era possível proteger algo ou alguém sem destruir outra coisa no processo? E qual seria, ou poderia ser, o meu papel nisso tudo – eu, o estranho renascido, o observador deslocado com memórias de um lugar onde essas perguntas pareciam distantes, filosóficas, quase irrelevantes?

Enquanto caminhávamos de volta para casa, o sol começando a se pôr e lançando longas sombras que dançavam pelo caminho como espectros, senti o peso daqueles incontáveis nomes eternizados no granito lúgubre.

Eram os ecos da guerra, fantasmas silentes que assombravam cada canto de Konoha. E eu sabia, com uma certeza gelada, que eles ressoariam dentro de mim, moldando minha jornada neste mundo, por muito, muito tempo.

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