— Hugo, um pacote para você! — gritou Alberto, recebendo um pequeno embrulho das mãos do carteiro. Ele assinou o nome do irmão no papel e seguiu animado em direção ao quarto de Hugo.
Hugo, que acabara de se barbear, observava seu reflexo no espelho, ensaiando olhares longos e fatais para as garotas. O espelho mostrava um rosto sardento de dezoito anos, simpático e saudável, adornado por cabelos tão vermelhos que ele era conhecido como "Foguinho".
— Deve ser presente de alguma admiradora — comentou, examinando o endereço digitado à máquina. Com um puxão de barbante, o embrulho se abriu, revelando uma caixa retangular.
— Oba! O que é isso? — exclamou ele, curioso. Dentro, havia um grande besouro negro, com um chifre na testa, preso a uma rolha por um comprido alfinete entomológico. A carapaça do inseto brilhava com reflexos azulados, e Hugo franziu a testa.
— Que coisa estranha! — disse, desapontado. — Quero saber quem foi o camarada que me pregou essa peça.
— Jogue for a esse bicho de uma vez! — aconselhou Alberto.
Hugo, porém, não se deixou convencer e ficou observando o inseto pensativo.
— Nada disso. Aposto que foi o Carlos quem mandou isso. Ele adora pregar peças nos outros. Vou investigar e, se for o caso, vou devolver esse escaravelho para ele na mesma caixa, embrulhado do mesmo jeito.
Assim, "Foguinho" colocou o besouro em cima de uma estante e tentou desviar a mente do assunto.
— E então, vamos ao baile hoje? — perguntou Alberto, com entusiasmo.
— Claro! Vai ser uma curtição! — respondeu Hugo. — Quero ser o primeiro a chegar e o último a sair.
— Então você fica e eu volto. Tenho exame depois de amanhã e preciso revisar uns pontos. Essa tal de anatomopatologia é um caso sério!
— Ah, eu só quero ver o doutorzinho de anel com pedra verde no dedo... — disse Hugo, irônico.
— Ainda faltam dois anos para isso, seu bobo!
— Dois anos? Que chateação! — Alberto resmungou, arrancando a folha que marcava o dia da véspera de uma folhinha na parede. — Que bom! Só falta uma semana para os "velhos" chegarem da América! Pedi para papai dar uns beijinhos por mim na Brooke Shields. Puxa! Aquilo é que é mulher!
— Fantástica! — repetiu Alberto, pronunciando cada sílaba com exagero.
Os dois irmãos conversaram mais um pouco antes de cada um seguir seu caminho.
— Dez horas e Seu Hugo ainda não se levantou! — reclamou a arrumadeira. — A gente trabalhando desde cedo e o mocinho no bem-bom... Isso é desaforo!
— Deixe o rapaz dormir — respondeu o jardineiro. — Com certeza ele chegou tarde essa noite.
— Não chegou não. O baile foi antes de ontem. Você protégé o menino um bocado, hem? — retrucou a arrumadeira, enquanto passava a enceradeira elétrica no chão da sala.
— Quem sabe se ele está doente?
— Ele que se arrume...
Pouco depois do meio-dia, Alberto voltou da Faculdade de Medicina e foi diretamente para o quarto do irmão, ansioso para comentar sobre a prova que acabara de fazer. Estranhando a porta fechada, ele bateu e chamou:
— Hugo! Hugo!
A inquietude começou a crescer quando não obteve resposta.
— Abra, sou eu, Alberto!
Sem resposta, ele se afastou da porta, tomou impulso e arremessou-se contra ela. A madeira cedeu, revelando uma cena horrenda: Hugo estava deitado na cama, uma longa espada cravada em seu peito esquerdo.
A arrumadeira soltou um grito e desmaiou ao ver a cena. Alberto correu até o irmão, tentando sentir seu pulso, mas foi em vão; o corpo estava frio. Ele caiu de joelhos, soluçando.
— O que foi? O que é isso? — perguntaram apressados o copeiro, a cozinheira e o jardineiro, que correram até o quarto.
Alberto, com a voz trêmula, respondeu:
— Não toquem em nada. Deixem tudo como está.
Ele correu para o telefone e, com a mão trêmula, discou um número.
— Está bem — disse o Delegado de plantão. — Vou requisitar a Polícia Técnica e avisar o serviço de Medicina Legal.
Em poucos minutos, a casa se encheu de parentes e vizinhos, todos intrigados com a enorme espada cravada no peito de Hugo. Por que deixá-la ali?
Logo chegaram os peritos da Polícia Técnica, um médico e um enfermeiro. Somente eles e Alberto foram autorizados a entrar no quarto.
— Hum... — murmurou o médico, examinando o corpo com atenção. — Hemorragia interna... O óbito deve ter ocorrido há cerca de doze horas. Provavelmente à meia-noite.
— Estranho — observou um dos peritos. — Não há sinais de luta.
O médico ficou pensativo, respirando lentamente.
— Vocês não estão sentindo um leve cheiro de clorofórmio?
De fato, um odor discreto, ligeiramente enjoativo, pairava no ar, confirmando a suposição do médico.
— Quer dizer que meu irmão morreu narcotizado? — Alberto perguntou, angustiado.
— Sim e não. O assassino provavelmente o encontrou dormindo, aplicou um lenço embebido em clorofórmio e cravou a espada em seu peito. E teve boa pontaria, pois o golpe foi direto no coração.
— Não é possível morrer assim, estupidamente, à toa... — Alberto exclamou, em desespero. — Meu irmão não tinha inimigos, todo mundo gostava dele! O que não consigo entender é por que o criminoso usou essa arma, deixando-a ali ao lado da vítima. Seria um lunático?
Um dos peritos, abrindo cuidadosamente o pano que cobria a lâmina, examinou o punho esculpido com delicadeza.
— É uma espada espanhola, provavelmente feita em Toledo, no início do século dezessete — disse ele. — Estou estudando isso e acabei de ler um livro com uma fotografia igual a ela.
— Duvido que o assassino tenha deixado impressões digitais — comentou o médico.
— Com certeza foi precavido e usou luvas — acrescentou o enfermeiro.
Alberto, perturbado, saiu do quarto para tentar uma ligação telefônica para Washington, onde seus pais estavam. Como contar-lhes uma tragédia tão estranha?
Os peritos terminaram o levantamento e deixaram o quarto. A casa, uma construção térrea e moderna, tinha janelas abertas, o que tornava fácil a entrada de qualquer um no quarto de Hugo.
As coisas seguiram seu curso normal. O médico emitiu o atestado de óbito, e o Inspetor Pimentel assumiu o caso. Sua primeira ação foi reunir todos os empregados da casa. A cozinheira, que adorava Hugo e trabalhava para a família há quinze anos, o jardineiro, que também o apreciava, e a arrumadeira e o copeiro, que eram indiferentes, mas cumpriam suas obrigações.
Todos alegaram que não tinham álibis, pois estavam dormindo em seus quartos durante o crime. Ninguém havia visto ou ouvido nada.
— Eu estava até sonhando com cobras — disse Elza, a arrumadeira.
Pedro, o copeiro, anotou o fato disfarçadamente, esperando aproveitar a informação na loteria. Embora o que os criados dissessem fosse perfeitamente lógico, isso não afastava as suspeitas.
— Havia mulheres na vida dele? — perguntou o Inspetor.
— Muitas em geral, nenhuma em particular — respondeu Alberto. — Hugo era um rapaz popular entre as garotas. Sempre alegre, esportivo, dançava bem e flertava sem compromisso.
— Esse caso é muito estranho — ponderou o Inspetor. — Talvez o assassino tenha se assustado com um ruído e fugido, sem tempo de retirar a arma. Vou visitar os antiquários da cidade para ver se conseguimos descobrir a origem dessa espada. Quem sabe isso revela alguma pista.
Três dias depois, os desolados pais de Hugo chegaram. Seu pai, um físico de renome mundial, estava prestes a embarcar em uma série de viagens pelo exterior. Um prêmio de cinquenta milhões de cruzeiros foi prometido a quem descobrisse o assassino.
Alberto não conseguia se conformar. Ele havia emagrecido, e seus olhos azuis, ligeiramente oblíquos, pareciam ainda maiores em seu rosto moreno e sério. Ele jurou a si mesmo que faria o possível para esclarecer a morte de Hugo.
Mas ele não imaginava que isso era apenas o começo — o início de uma série de eventos terríveis e absurdos que logo inundariam Vista Alegre, até então uma das cidades mais lindas e pacatas do Brasil.