Os murmúrios no salão eram como o zumbido de um enxame inquieto. Enquanto aguardávamos as próximas apresentações, pude ouvir claramente as conversas dos nobres de Sangue-Puro ao nosso redor.
“O filho do Duque Hoffmann foi impressionante, não acha?”
“Certamente. A Runa dele já está quase purificada. Talento natural.”
“Como era de se esperar de uma linhagem tão antiga.”
“Diferente desses Arcanos que mal conseguem acumular energia decente...”
Cerrei os punhos discretamente. Esses comentários eram feitos em voz baixa, mas alta o suficiente para que pudéssemos ouvir. Era proposital, é claro. Meu pai mantinha o rosto impassível, mas notei a tensão em sua mandíbula. Minha mãe apertou meu ombro levemente, um lembrete silencioso para manter a calma.
Do outro lado, alguns nobres Arcanos respondiam com seus próprios comentários.
“Força bruta sem refinamento. Típico.”
“Veremos quem realmente impressiona hoje.”
“Dizem que o jovem Freimann tem afinidade múltipla...”
Essa última frase fez meu estômago revirar. Como sabiam? Ou era apenas um rumor? Olhei para Mestra Margareth, que observava tudo com um olhar analítico, como se estivesse estudando cada reação, cada palavra sussurrada.
— A próxima a se apresentar — anunciou o Chanceler, sua voz ecoando pelo salão — Lady Isabelle Von Stein!
Meu coração acelerou ao ver Belle se afastar de seus pais. Ela caminhou com uma confiança que eu sabia ser parcialmente forçada. Conhecia-a bem o suficiente para notar a leve tensão em seus ombros, a maneira como seus dedos se moviam sutilmente contra a bainha de sua espada cerimonial. Estava nervosa, mas determinada.
Seu vestido azul-escuro com detalhes prateados contrastava com seu cabelo vermelho-fogo, que estava preso em um coque elaborado com algumas mechas soltas emoldurando seu rosto. Ela parecia mais velha, mais séria do que a garota com quem eu treinava e discutia quase diariamente.
Belle fez uma reverência perfeita diante do Rei Theron, que a observava com interesse.
— Lady Isabelle Von Stein, filha do Conde Albert Von Stein — anunciou ela, sua voz clara e firme.
— Mostre-nos sua Runa, Lady Stein — instruiu o Chanceler.
Belle ergueu a mão direita, e uma luz âmbar brilhante emanou de sua palma. Era uma Runa da Centelha, como a minha, mas a dela pulsava com uma energia mais refinada, quase translúcida em alguns pontos. Estava muito próxima da purificação completa.
— Runa da Centelha, estágio Âmbar Brilhante, quase purificada — anunciou ela com um toque de orgulho contido.
— Sua afinidade elemental? — perguntou o Chanceler.
— Fogo, Chanceler — respondeu Belle. Então, após uma breve pausa, acrescentou: — E minha arte divergente, Raio.
Um murmúrio percorreu o salão. Arte divergente aos oito anos? Era raro, mesmo para uma Von Stein. Vi o Rei inclinar-se ligeiramente para frente, seu interesse claramente despertado.
— E o que deseja demonstrar hoje, Lady Stein? — perguntou o Chanceler.
Belle ergueu o queixo, seus olhos âmbar brilhando com determinação. — Solicito um duelo de demonstração com um dos Cavaleiros Reais, se Sua Majestade permitir.
O murmúrio no salão aumentou consideravelmente. Alguns nobres de Sangue-Puro pareciam chocados com a audácia, outros impressionados. Ouvi claramente a voz do Duque Hoffmann: “Arrogância típica dos Stein.” Seu filho, Hugo, parecia particularmente irritado.
O Rei Theron, no entanto, sorriu levemente. — Concedido, Lady Stein. Capitão Roland, por favor.
Um homem alto e de ombros largos, usando a armadura cerimonial da Guarda Real, avançou até o centro do tablado. Ele parecia ter uns trinta anos, com uma cicatriz fina cruzando sua sobrancelha direita. Fez uma reverência ao Rei e depois se virou para Belle, desembainhando uma espada de treino.
Belle desembainhou sua própria espada cerimonial, uma lâmina mais leve e menor, mas perfeitamente equilibrada. Ela respirou fundo e então anunciou: — Corpus Fulminis, a Arte Divergente da Casa Stein, ensinada a mim por meu pai, o Conde Albert Von Stein.
Ela fechou os olhos por um breve momento. Quando os abriu novamente, algo havia mudado. Uma energia dourada começou a crepitar ao redor de seu corpo, pequenas faíscas dançando sobre sua pele e cabelo. A lâmina de sua espada foi envolvida por um brilho elétrico, e seus olhos... seus olhos pareciam emitir pequenas centelhas douradas.
O Cavaleiro Roland assumiu uma postura defensiva, claramente impressionado, mas profissional. Belle não hesitou. Com um movimento que parecia quase impossível de acompanhar, ela executou um Passus Aethereus perfeito, desaparecendo de onde estava e reaparecendo a dois passos do cavaleiro, sua espada já em movimento.
O duelo que se seguiu foi uma dança de luz e velocidade. Belle não era páreo para a força ou experiência do cavaleiro, mas o Corpus Fulminis a tornava incrivelmente rápida. Seus golpes vinham de ângulos inesperados, e cada vez que suas lâminas se encontravam, pequenas faíscas douradas explodiam no ar. O cavaleiro defendia-se com habilidade, mas era visível que estava se esforçando para acompanhar.
Após dois minutos de duelo intenso, o Chanceler bateu seu cajado no chão. — Suficiente!
Belle recuou imediatamente, a energia elétrica ao seu redor diminuindo gradualmente até desaparecer. Ela fez uma reverência ao cavaleiro. — Agradeço pela demonstração, Capitão Roland.
O cavaleiro retribuiu a reverência, um sorriso respeitoso em seu rosto. — Foi uma honra, Lady Stein. Impressionante controle para alguém tão jovem.
Belle então se virou para o Rei e fez uma reverência profunda. O Rei Theron assentiu, um brilho de aprovação em seus olhos. — Bem feito, Lady Stein. A Casa Stein continua a produzir Espadachins Arcanos notáveis.
Belle agradeceu e caminhou de volta para seus pais, a cabeça erguida, mas pude ver o alívio em seu rosto. Quando passou por mim, nossos olhares se cruzaram. Havia orgulho em seus olhos, mas também um desafio silencioso. “Sua vez”, dizia seu olhar. “Mostre a eles o que pode fazer.”
Senti meu estômago apertar. A apresentação dela havia sido espetacular. Como eu poderia seguir isso? A ansiedade começou a crescer dentro de mim, uma pressão no peito que ameaçava sufocar meus pensamentos.
— O próximo a se apresentar — anunciou o Chanceler — Lorde Elian Freimann!
Meu nome ecoou pelo salão, e por um momento, senti como se minhas pernas tivessem virado pedra. Meu pai colocou a mão em meu ombro, um toque firme e encorajador. Minha mãe sorriu para mim, seus olhos brilhando com confiança. Mestra Margareth apenas assentiu levemente, mas seu olhar dizia tudo: “Lembre-se da promessa. Impressione-os.”
Respirei fundo e comecei a caminhar em direção ao tablado. O salão parecia ter se alongado, a distância entre mim e o Rei esticando-se infinitamente. Cada passo ecoava em meus ouvidos, misturando-se com os murmúrios que cresciam ao meu redor.
Foi então que percebi algo – ou melhor, alguém – ao meu lado. Vivian. Minha irmãzinha de quatro anos havia me seguido sem que eu percebesse, sua mãozinha agora segurando a minha. Ela olhou para mim com seus grandes olhos azuis, um sorriso inocente em seu rosto.
— Vou com você, Eli — sussurrou ela.
Antes que pudesse responder, ouvi os comentários ao nosso redor.
“Olhe para isso, até a criança está se metendo.”
“Rato sujo, igual ao irmão.”
“Que falta de disciplina, típico desses Arcanos.”
A raiva explodiu dentro de mim como uma fornalha subitamente acesa. Como ousavam? Insultar uma criança de quatro anos? Minha irmã? Senti meu poder reagir à minha fúria, a Runa em minha mão esquerda começando a pulsar dolorosamente, o calor subindo pelo meu braço.
Então me lembrei das palavras de Mestra Margareth: ”Controle, Elian. A raiva é combustível, não direção.” Fechei os olhos por um momento, forçando-me a respirar profundamente. Senti a pequena mão de Vivian apertar a minha, e de alguma forma, aquele toque inocente me trouxe de volta ao centro. A raiva não desapareceu, mas transformou-se em algo mais frio, mais focado.
Chegamos diante do Rei Theron. Fiz uma reverência profunda, e Vivian, imitando-me, fez uma pequena mesura desajeitada que arrancou sorrisos discretos de alguns cortesãos.
— Lorde Elian Freimann, filho do Baronete Lucius Freimann — anunciou o Chanceler. Ele olhou para Vivian com uma sobrancelha levantada, mas não comentou sua presença.
— Mostre-nos sua Runa, Lorde Freimann — instruiu ele.
Ergui minha mão esquerda, e a Runa da Centelha brilhou com uma luz âmbar dourado-clara. Não era tão refinada quanto a de Belle ou Hugo, mas pulsava com energia densa e vibrante.
— Runa da Centelha, estágio Âmbar Dourado-Claro — anunciei, mantendo a voz firme apesar do nervosismo.
— Sua afinidade elemental? — perguntou o Chanceler.
Hesitei por um segundo. Este era o momento. — Fogo, Terra e Ar, Chanceler. Com maior afinidade ao Fogo.
O murmúrio no salão foi imediato e intenso. Afinidade tripla era rara, especialmente em alguém tão jovem. Vi expressões de espanto, incredulidade e, em alguns casos, puro ceticismo.
“Impossível!”
“Ele está mentindo.”
“Nenhum Arcano dessa idade tem afinidade tripla.”
O Rei Theron inclinou-se para frente, seus olhos penetrantes fixos em mim. — Está afirmando ter afinidade com três elementos, jovem Freimann?
— Sim, Vossa Majestade — respondi, sustentando seu olhar.
— E pode provar isso? — perguntou ele, sua voz neutra, mas seus olhos intensos.
Olhei para Vivian ao meu lado, que me observava com admiração absoluta. Seu sorriso confiante despertou uma memória recente, dos dias que antecederam nossa vinda ao palacio...
“Três dias antes, em meu quarto na Mansão Stein”
Eu estava sentado no centro do quarto, cercado por livros abertos e pergaminhos com anotações espalhados pelo chão. As cortinas estavam fechadas, e a única luz vinha de uma pequena lamparina arcana que flutuava acima da minha cabeça.
Por um dia inteiro, isolei-me ali, trabalhando em uma ideia que não me deixava em paz desde que vi Belle usar o Corpus Fulminis. Os raios vulcânicos. A arte divergente que eu imaginara meses atrás, mas que Mestra Margareth disse ser complexa demais para meu nível atual.
Mas agora, após ver o que Belle podia fazer, após sentir o desdém de Hugo e Oliver, após ouvir as histórias sobre o preconceito contra a Nobreza Arcana... Eu precisava tentar. Precisava criar algo meu.
Comecei visualizando mentalmente o processo. Os raios vulcânicos não eram como os raios comuns das tempestades. Eles nasciam do calor extremo, da fricção de partículas, da pressão violenta. Era uma combinação de elementos, não apenas um.
Inicialmente, pensei que fosse apenas Fogo e Ar, mas algo faltava. Estudando os relatos de erupções vulcânicas, percebi: era a poeira. A terra pulverizada, carregada de energia, que criava aquela condição única para os “raios sujos”, como eram chamados.
No segundo dia, fui para o campo de treinamento da Mansão Stein ao amanhecer, antes que qualquer um acordasse. Precisava de espaço, de silêncio.
Comecei tentando canalizar os três elementos simultaneamente, mas era como tentar segurar água, areia e vento com as mesmas mãos – impossível. Precisava de uma sequência, um método.
Após horas de tentativas frustradas, lembrei-me das lições de Mestra Margareth sobre os selos arcanos – gestos que ajudavam a focar e direcionar a energia. Talvez eu precisasse criar meus próprios selos para esta arte específica.
Primeiro, o Selo da Raiz Flamejante para o Fogo. Entrelaçando os indicadores e erguendo os polegares como chamas gêmeas, canalizei o calor do meu centro, sentindo-o subir pelo peito. O ar ao meu redor começou a tremeluzir com o calor.
Em seguida, o Selo da Terra que Guarda. Cruzando os braços sobre o peito, punhos cerrados, girando os antebraços em sentidos opostos, senti meus pés afundarem levemente no solo. A terra respondeu, contendo e comprimindo a energia que eu já havia gerado.
Depois, o Selo do Sopro que Rasga para o Ar. Afastando os braços e abrindo as mãos em espiral, com os dedos separados, criei um vórtice sutil ao meu redor. Poeira e folhas secas começaram a girar, atraídas pela energia que eu acumulava.
Mas ainda não era suficiente. Os três elementos estavam presentes, mas não unificados. Faltava a intenção, a visualização final.
Fechei os olhos e imaginei um vulcão – não como uma montanha, mas como uma alma sufocada, pressionada além do limite. No centro dessa alma, vi uma cor que não era vermelha nem laranja, mas azul – a chama que queimou tanto que se purificou.
“Se o fogo for puro,” pensei, “ele não brilha como sangue. Ele brilha como céu.”
E então, liberei tudo.
A pressão rompeu a contenção com um estalo seco. Uma coluna de ar quente, poeira encantada e faíscas brilhantes explodiu de baixo para cima. E no instante seguinte, um raio azul rasgou o ar, como uma lança feita de trovão.
O esforço me deixou exausto, caído de joelhos, ofegante. Mas funcionou. Funcionou!
Nas tentativas seguintes, consegui reproduzir o efeito apenas duas vezes. Era difícil, consumia muita energia, exigia uma concentração absoluta. Mas agora eu sabia que era possível.
De volta ao presente, diante do Rei e de toda a corte, eu sabia o que precisava fazer. Era arriscado, exaustivo, mas era minha chance de mostrar quem eu era, de defender minha família, de cumprir minha promessa a Mestra Margareth.
— Posso demonstrar, Vossa Majestade — respondi, minha voz mais firme agora.
Vivian apertou minha mão uma última vez e então se afastou alguns passos, como se soubesse instintivamente que eu precisava de espaço.
Respirei fundo e comecei. Primeiro, o Selo da Raiz Flamejante. Entrelaçando os indicadores e erguendo os polegares, senti o calor familiar crescer dentro de mim. O ar ao meu redor começou a tremeluzir, e alguns nobres nas primeiras fileiras recuaram instintivamente.
Em seguida, o Selo da Terra que Guarda. Cruzando os braços sobre o peito, punhos cerrados, senti a conexão com o solo sob meus pés, mesmo através do mármore polido do palácio. A energia do Fogo foi contida, comprimida, intensificada.
Depois, o Selo do Sopro que Rasga. Afastando os braços e abrindo as mãos em espiral, criei o vórtice. Pequenas partículas de poeira e luz começaram a girar ao meu redor, atraídas pela energia que eu acumulava.
Agora vinha a parte mais difícil. Fechei os olhos por um breve momento, visualizando o vulcão, a alma sufocada, a chama azul purificada. Senti o Querer, a Consciência e a Força Vital se alinharem perfeitamente, como Mestra Margareth havia me ensinado.
E então, liberei tudo.
A pressão rompeu com um estalo que ecoou pelo salão. Uma coluna de ar quente e partículas brilhantes explodiu de baixo para cima, e um raio azul, mais intenso do que qualquer um que eu havia conseguido antes, subiu do chão até o alto teto abobadado do salão. O estrondo foi ensurdecedor, e o calor irradiou em ondas, fazendo as chamas dos candelabros dançarem violentamente.
Por um momento, o salão inteiro foi banhado em uma luz azul fantasmagórica. E então, tão rapidamente quanto surgiu, o raio se dissipou, deixando apenas o eco do trovão e o cheiro de ozônio no ar.
O silêncio que se seguiu foi absoluto. Nem mesmo um sussurro. Todos os olhos estavam fixos em mim – o Rei, o Chanceler, os nobres, todos pareciam congelados em expressões de choque e espanto.
Eu estava ofegante, sentindo o suor escorrer por minhas têmporas, mas mantive-me ereto. Fiz uma reverência profunda ao Rei, tentando controlar minha respiração.
— Fulmínea da Ira Ígnea — anunciei, nomeando minha criação pela primeira vez em voz alta.
O Rei Theron estava visivelmente impressionado, seus olhos arregalados, as mãos apertando os braços do trono. O Chanceler parecia ter perdido a fala por um momento.
Finalmente, o Rei se recompôs. — Notável, Lorde Freimann. Verdadeiramente notável.
Agradeci com outra reverência e comecei a caminhar de volta para minha família, as pernas um pouco trêmulas pelo esforço. O silêncio foi quebrado por aplausos – primeiro alguns esparsos, depois crescendo em volume. Eram principalmente os nobres Arcanos, aplaudindo com entusiasmo, alguns até gritando parabéns.
A maioria dos nobres de Sangue-Puro permanecia em silêncio, muitos com expressões de choque ou desconforto. Hugo e Oliver pareciam particularmente atordoados, incapazes de esconder sua surpresa. Amalia, por outro lado, aplaudia discretamente, um pequeno sorriso em seu rosto.
Quando olhei para Belle, vi um sorriso largo de aprovação e orgulho. Ela assentiu para mim, um gesto que dizia mais do que palavras poderiam expressar.
Ao chegar junto de minha família, fui recebido por abraços. Minha mãe tinha lágrimas nos olhos, meu pai parecia inchado de orgulho. Vivian pulava animadamente ao meu lado.
— Você conseguiu, Eli! Você fez um raio azul! — exclamava ela, encantada.
Mestra Margareth colocou a mão em meu ombro, seus olhos brilhando com uma satisfação contida. — Você cumpriu sua promessa, Elian. Impressionou a todos.
— Que nome você deu ao feitiço? — perguntou ela, curiosidade genuína em sua voz.
— Fulmínea da Ira Ígnea — respondi, ainda um pouco ofegante.
Ela assentiu, aprovando. — Um nome adequado para uma arte tão poderosa.
As apresentações continuaram após a minha, mas percebi que muitos olhares ainda se voltavam para nossa direção. Algo havia mudado. O desdém inicial havia sido substituído, em muitos casos, por uma curiosidade relutante ou até mesmo um respeito hesitante.
Quando todas as apresentações terminaram, o Chanceler anunciou o encerramento da cerimônia formal. A música começou a tocar, e os nobres começaram a circular pelo salão, formando grupos, conversando, cumprimentando-se.
Quase imediatamente, o Conde Albert, a Condessa Elisabeth e Belle se aproximaram de nós. O Conde Albert tinha um sorriso largo no rosto.
— Lucius, Maria, Mestra Margareth! E jovem Elian! — cumprimentou ele, a voz ressoando com genuíno entusiasmo. — Que apresentação! Magnífico, meu rapaz! Simplesmente magnífico! Deixou todos sem palavras!
— Concordo plenamente, Albert — disse meu pai, ainda visivelmente emocionado. — Elian nos surpreendeu a todos.
— Foi esplêndido, Elian — acrescentou a Condessa Elisabeth, com um sorriso gentil. — E Isabelle, querida, você também foi maravilhosa. Aquele Corpus Fulminis foi de tirar o fôlego.
Belle corou levemente com o elogio da mãe, mas seus olhos encontraram os meus. — Você também foi incrível, Elian. Aquilo... aquilo foi algo que nunca vi antes.
Senti meu próprio rosto esquentar. — Você também, Belle. Aquele duelo... foi impressionante.
Ficamos nos olhando por um momento, um entendimento silencioso passando entre nós. Tínhamos ambos enfrentado a pressão e mostrado nossa força, cada um à sua maneira.
— Bem — disse o Conde Albert, quebrando o momento —, acho que esta ocasião pede uma celebração. E talvez... uma dança?
A música tinha mudado para uma valsa. Olhei para Belle. A ideia pareceu surgir em minha mente quase por conta própria, impulsionada pela adrenalina e pelo momento de conexão.
— Belle... — comecei, um pouco hesitante. — Você... gostaria de dançar?
Seus olhos se arregalaram levemente de surpresa, mas um sorriso rápido surgiu em seus lábios. — Eu adoraria, Elian.
Ofereci minha mão, ela aceitou, e nos afastamos um pouco de nossas famílias, encontrando um espaço no centro do salão onde outros casais já giravam. Coloquei uma mão em sua cintura, a outra segurando sua mão, e tentamos encontrar o ritmo da valsa.
Foi... desajeitado. Muito desajeitado. Nenhum de nós tinha tido muito tempo para aulas de dança entre treinos de espada e conjuração de feitiços. Pisamos nos pés um do outro algumas vezes, giramos fora de hora, e quase colidimos com outro casal.
— Acho que passamos mais tempo treinando do que aprendendo a não tropeçar — murmurei, tentando não rir.
Belle riu também, uma risada genuína e clara. — Definitivamente. Acho que somos melhores em desviar de golpes do que de outros dançarinos.
— Pelo menos não estamos soltando raios ou faíscas — acrescentei.
— Seria mais interessante, não acha? Uma Valsa Fulminante?
Rimos juntos, e a dança desajeitada pareceu menos importante. Era bom estar ali, com ela, compartilhando aquele momento estranho e divertido depois de toda a tensão.
Enquanto dançávamos (ou tentávamos), vários nobres, tanto Arcanos quanto alguns Sangue-Puro mais curiosos ou impressionados, aproximaram-se de nossos pais para oferecer cumprimentos. Vi alguns apontando discretamente para mim e Belle, cochichando. Os olhares não eram mais apenas de desdém ou choque; havia respeito agora, mesmo que relutante em alguns casos.
Filhos de outros nobres também vieram cumprimentar nossos pais e, por extensão, a nós. Alguns eram formais e educados, outros claramente curiosos sobre a Fulmínea da Ira Ígnea ou o Corpus Fulminis. Hugo e Oliver, notei, mantinham distância, conversando apenas com outros de seu círculo fechado, lançando olhares ressentidos em nossa direção de vez em quando.
A cerimônia chegava ao fim. O Rei Theron se levantou de seu trono, e o salão inteiro silenciou imediatamente. Ele caminhou até a frente do tablado, sua presença comandando atenção absoluta.
— Nobres de Malkut — começou ele, sua voz profunda ecoando pelo salão. — Hoje testemunhamos o futuro de nosso reino. Nas habilidades demonstradas por estes jovens, vemos a promessa de dias ainda mais gloriosos para Malkut.
Ele fez uma pausa, seus olhos percorrendo o salão. Por um momento, seu olhar pareceu se deter em mim e Belle, embora não tenha mencionado nomes.
— Que as centelhas acesas hoje cresçam para se tornarem chamas que iluminarão nosso caminho. Que a força demonstrada hoje se torne a proteção de amanhã. E que todos nós, Sangue-Puro e Arcanos, lembremos que é na união de nossas forças que Malkut encontra sua verdadeira grandeza.
Suas palavras pareciam carregadas de um significado mais profundo, quase um aviso velado. Ou talvez fosse apenas minha imaginação, ainda agitada pelos eventos do dia.
O Rei fez um gesto final de despedida, e a cerimônia foi oficialmente encerrada. Os nobres começaram a se dispersar, alguns ainda conversando animadamente sobre as apresentações, outros já se preparando para partir.
Olhei para Belle, que ainda segurava minha mão da nossa tentativa de dança. Havia uma nova compreensão entre nós, forjada naquele dia de desafios e triunfos. Não éramos mais apenas parceiros de treino ou amigos relutantes. Éramos algo mais – aliados, talvez, em um mundo que nem sempre nos acolheria de braços abertos.
E enquanto observava nossas famílias conversando, o respeito mútuo evidente em seus rostos, senti uma certeza crescer dentro de mim: este era apenas o começo de nossa jornada. As centelhas haviam sido acesas, e agora só poderiam crescer.