O mestre da Seita Não Ortodoxa permaneceu parado entre os restos da cabana, o sangue fluindo vigorosamente do corte vertical que rasgava seu rosto e atingia o ombro. Ignorando a dor intensa, seus olhos (o bom e o ferido) analisavam os destroços da vida pacífica que ele acabara de destruir, sua mente focada inteiramente na anomalia que jazia inconsciente: Fang Yan.
Enquanto ele processava a cena, um de seus discípulos, um homem robusto e treinado, chegou ao local, parando bruscamente ao ver o estado do mestre.
"Mestre!" o discípulo exclamou, a voz tingida de choque e raiva. "O que aconteceu? Quem se atreveu...?"
O mestre, sem desviar o olhar do jovem, apenas apontou com um gesto lento para Fang Yan. O garoto estava caído, inerte, o sangue já escorrendo da parte de trás de sua cabeça, onde o impacto violento contra a parede da cabana havia causado uma ferida considerável.
O discípulo olhou para o jovem de dezesseis anos, depois para o corpo do fazendeiro morto, e então para o ferimento grotesco no rosto do mestre. A conclusão era inevitável, e a fúria acendeu-se nos olhos do seguidor.
"Permita-me acabar com ele, Mestre. Pela sua honra e pela afronta cometida," sibilou o discípulo, a intenção de matar se manifestando em uma leve emissão de Qi ao redor de seus punhos.
"Não," ordenou o mestre, a voz grave e absoluta, calando a intenção homicida do subordinado. "Não toque nele."
O discípulo congelou, confuso. Matar o agressor era a resposta esperada, a única honrosa. Olhou para o mestre, buscando uma justificativa para aquela ordem inesperada, mas apenas encontrou uma fria determinação no olhar remanescente. Obedeceu, embora sua confusão fosse palpável no silêncio que se seguiu.
O mestre voltou a observar Fang Yan. A lembrança do sorriso, daquela frieza diabólica e da capacidade de reagir com tal precisão em um momento de sufocamento absoluto, era o verdadeiro atrativo. Aquele garoto era uma arma não forjada, uma mentalidade que, se canalizada, superaria qualquer talento marcial nato.
Ele ponderou sobre a natureza da Seita Não Ortodoxa: um lugar onde a crueldade era uma ferramenta, a ambição a única divindade e a falta de escrúpulos uma virtude. Um jovem capaz de sorrir para a morte do seu único parente e para o seu próprio desmaio... ele não precisaria ser quebrado; ele precisava apenas ser direcionado.
"Ele pode ser útil," murmurou o mestre, mais para si mesmo do que para o discípulo. "Um espírito assim não deve ser desperdiçado."
Sem mais palavras, o mestre se abaixou. Com a dor do corte e a perda de sangue, ele precisou de um momento para se firmar, mas logo pegou Fang Yan. O jovem, pequeno para a idade e inconsciente, foi jogado sobre o ombro do mestre como um saco de arroz.
"Vamos," disse o mestre, ignorando o luto e a destruição que deixava para trás, "O garoto está vindo conosco. Ele terá um novo propósito."
O discípulo observou o mestre virar as costas, carregando seu agressor. Aquela era uma lição clara sobre as prioridades voláteis e perigosas de sua Seita: a utilidade era o único critério de sobrevivência, e, por algum motivo que só o mestre compreendia, o garoto demônio-sorridente havia se tornado útil.
Eles se afastaram da fazenda, deixando para trás o corpo do curandeiro, a cabana arruinada e o início violento da nova vida de Fang Yan, que agora era uma propriedade valiosa a caminho das sombrias muralhas da Seita Não Ortodoxa.
