Valtraz não tinha inverno. O chão era rachado, coberto por cinzas quentes. As montanhas ao redor vomitavam fumaça, e o céu parecia eternamente alaranjado. Era um mundo em combustão — perfeito para Rhaziel.
Ele chegou à vila de El'Kaan montado em um cavalo negro, suado, cansado da longa viagem. A população o olhava com medo: o rapaz de olhos vermelhos e aura flamejante parecia mais uma maldição do que um salvador.
— Você é o enviado? — perguntou um ancião, de pele marcada pela fuligem.
— Sou Rhaziel. Vim conter os espíritos.
— Contê-los? Garoto... aqui, só existe uma linguagem que eles entendem: destruição.
Rhaziel ergueu o olhar. O calor que irradiava dele era quase visível.— Então talvez eles me entendam melhor do que você pensa.
Naquela noite, os tambores soaram.
Era assim que os aldeões avisavam sobre a chegada dos espíritos de cinza — entidades que vinham com o crepúsculo, flutuando entre as rochas, devorando tudo com seu fogo impuro.
Rhaziel correu para a planície. O céu estava negro. Do chão, rachaduras brilhantes começaram a se abrir. Um rugido ressoou.
Diante dele, surgiu o espírito principal — um colosso feito de carvão e chamas escuras. Olhos como brasas, braços longos demais, a respiração dele exalava fumaça venenosa.
Rhaziel sorriu.— Finalmente.
O combate começou.
As chamas do inimigo não eram comuns. Eram feitas de magia ancestral corrompida. Quando atingiram o chão, derreteram rochas. Rhaziel desviava com agilidade, girando no ar, liberando rajadas de fogo limpo — seu fogo era dourado agora, uma nova tonalidade surgida após meses de treino.
Cada golpe trocado fazia a terra tremer. Mas algo mudou.
Durante um instante, o espírito hesitou. Rhaziel percebeu. Havia algo por trás da fúria — algo antigo e contido. Em vez de terminar com um golpe brutal, ele concentrou sua energia no centro do próprio peito e invocou a Chama do Coração — um feixe de fogo puro que não queimava matéria, mas emoções corrompidas.
O espírito urrou, desfazendo-se em uma chuva de brasas, e o calor cessou.
Os aldeões saíram de suas casas. Não aplaudiram. Só observaram, em silêncio.
Rhaziel olhou para o céu. Pela primeira vez, pequenas fagulhas azul-alaranjadas giravam ao seu redor — sinal de que sua magia evoluíra. Ele tocou o ombro queimado, respirando fundo.
— Um espírito não é sempre um inimigo — murmurou, lembrando as palavras de Therys.
Do outro lado do continente, Therys olhava o mesmo céu, sem saber por quê, com a estranha sensação de que algo dentro dele estava em equilíbrio.