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Chapter 2 - Capítulo 2 – Entre Fragmentos e Flores

O som da voz doce a despertou como um sussurro vindo de outra vida.

— Senhorita Eleonor! Acorde! Olha como o dia está lindo hoje!

Os olhos se abriram devagar. A luz do sol filtrava-se pelas cortinas floridas do quarto. O aroma suave de lírios flutuava no ar, e o canto dos pássaros parecia entoar uma melodia de boas-vindas. Mas nada daquilo fazia sentido.

Eleonor ergueu-se num sobressalto. Seu corpo pequeno, frágil, coberto por uma camisola de renda clara. As mãos... tão pequenas. Os braços... lisos, sem cicatrizes. O espelho ao lado da cama refletia o rosto de uma criança de dez anos — inocente, angelical. Mas seus olhos... carregavam o peso de uma alma que já havia morrido.

— Maria...? — sussurrou ela, a voz vacilante. — Isso é real?

A babá, uma senhora robusta de olhos castanhos e sorriso eterno, inclinou a cabeça com carinho, franzindo o cenho.

— Do que está falando, senhorita? Ainda está sonhando? Venha, levante-se! O café está quase servido! Sua mãe preparou suas torradinhas favoritas!

Mas Eleonor não se moveu. O coração batia descompassado, e memórias dispersas pulsavam na sua mente. A escuridão. O fogo. A dor. O som seco da carne sendo rasgada pela explosão. Gritos. Sangue. BUMM.

"Eu morri", pensou.

Mas ali estava ela. No quarto de uma menina. Em um corpo estranho... e ao mesmo tempo familiar.

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O banho foi silencioso. A água quente caía sobre sua pele como um lembrete de que tudo era real. Quando se olhou no espelho novamente, tocou a própria bochecha. Macia. Jovem. Intacta.

— "Eleonor Antonelli..." — murmurou para si mesma. O sobrenome soava estranho agora. Na vida passada, ela fora conhecida como Livia. Livia, a Viúva Negra. A Indomável. Agora, renascida em um mundo aparentemente distante de sangue e guerras.

As roupas foram escolhidas por Maria: um vestido azul claro com rendas nos punhos. A antiga Eleonor provavelmente teria sorrido ao vestir aquilo. Mas agora, havia apenas silêncio.

Descendo as escadas da mansão, sentiu os olhos de todos sobre si.

O Marquês Eduardo Antonelli, seu pai, lia o jornal à cabeceira da mesa. Era um homem alto, de traços firmes, mas olhos gentis. Elena, sua mãe, a mulher de beleza delicada e sorriso acolhedor, já esperava com o chá servido e um beijo pronto.

— Bom dia, querida! Dormiu bem?

— Dormi, mãe — disse Eleonor, esforçando-se para manter a voz firme.

Elena franziu o cenho.

— Está doente, querida? Deixe-me ver se está com febre.

Ela estendeu a mão e tocou a testa de Eleonor. A menina não se afastou, mas também não reagiu com o entusiasmo esperado.

— Estou bem, mãe.

— Você está tão quieta hoje... — comentou Eduardo, olhando por cima do jornal. — Geralmente você alegra nossas manhãs com cantigas e perguntas sem fim. Aconteceu algo?

Eleonor hesitou. Seu olhar recaiu sobre os olhos ternos dos pais. Um nó apertava seu peito.

Ela não era aquela menina.

Não era aquela filha.

Era uma alma velha, marcada por batalhas, assassinatos e traições. Reencarnada em uma casa nobre, rodeada de amor... e mentiras.

A colher em sua mão tremia levemente. Deu uma mordida na torrada, mas o gosto era distante. Não era fome que sentia — era culpa.

Gritava dentro dela a verdade: vocês não me conhecem. Ela podia fingir. Podia sorrir. Mas aquela Eleonor... a doce, alegre e inocente Eleonor... estava morta. E em seu lugar estava alguém que não sabia mais como ser amada.

— Me desculpem... — disse, baixinho, apertando os punhos no colo.

— Desculpar pelo quê, minha flor? — perguntou Elena, com um sorriso paciente.

Eleonor desviou o olhar.

— Só... só estou um pouco cansada.

Os pais trocaram olhares discretos. Maria, de pé ao lado da porta, também notou algo de estranho. Mas ninguém insistiu. Afinal, era apenas uma manhã.

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Horas depois, Eleonor se encontrava no jardim da mansão. O lugar era um pequeno paraíso cercado por roseiras e canteiros de lavanda. O vento leve acariciava seus cabelos castanhos, agora presos em tranças infantis.

Sentada sob uma cerejeira, observava os galhos floridos. Lembrava-se de uma missão que fizera certa vez: assassinato silencioso nos campos do norte, em meio a um bosque florido. A beleza das flores contrastava com o sangue que escorria de sua lâmina naquela noite.

As mãos tremeram de novo.

"Você está viva, Livia... Ou será que não é mais ela?"

Essa era a questão que martelava em sua mente.

Quem era agora?

Uma criança nobre?

Uma alma condenada a fingir?

Ou alguém com uma nova chance?

A verdade ainda estava turva, como um espelho embaçado após o banho. Mas uma coisa era certa: ela não podia mentir para si mesma — não por muito tempo.

— Preciso entender... por que voltei? — sussurrou, fitando o céu.

E então, uma brisa mais forte soprou, trazendo o perfume das flores e, por um instante, uma sensação de paz.

Mas no fundo, Eleonor sabia: aquela paz era frágil. E mais cedo ou mais tarde, as sombras de sua vida anterior viriam cobrar seu preço.

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