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Chapter 2 - 2 - O Preço da Derrota

A arena já estava sendo montada quando Gabriel chegou ao ginásio para a coletiva pré-luta. Era sua última conferência antes da grande luta contra o prodígio do momento — Dante Reaves, 23 anos, campeão do circuito europeu, invicto, chamado pela mídia de “o novo rei”.

Gabriel observava os banners com o rosto do garoto ao lado do seu, como se estivessem no mesmo nível.

Naquela tarde, vestindo seu terno preto sob medida e com o rosto impassível, ele enfrentou os flashes da imprensa e as perguntas baratas dos repórteres. Ao seu lado, Dante sorria, confiante, como se o mundo já fosse seu. Gabriel não respondeu nenhuma provocação. Seus olhos estavam fixos na próxima luta, como sempre estiveram.

Mas naquele mesmo dia, algo inesperado aconteceu. Após a coletiva, o empresário-chefe da organização internacional do MMA, um magnata recluso chamado Vladimir Malkov, pediu para se encontrar com Gabriel em particular.

O encontro foi marcado em uma cobertura de hotel, com vista para a cidade noturna. Gabriel entrou na sala silenciosamente, onde Malkov o esperava com dois copos de uísque caro. Ele não era um homem imponente fisicamente, mas seu olhar era gelado como aço polido. Usava um terno branco impecável, e falava com um sotaque europeu carregado.

— Gabriel Monteiro... o homem que derrotou o tempo — disse ele, levantando o copo. — Onze anos no topo. Onze malditos anos. Você sabe o que isso significa?

Gabriel não respondeu. Encostou-se na parede e cruzou os braços.

— Significa que você é o obstáculo. O último muro. O mito que precisa cair... para que o mercado continue girando — continuou Malkov. — O público precisa de uma nova lenda, Gabriel. E você... você já deu tudo que podia.

Gabriel franziu o cenho, desconfiado.

— O que você quer?

Malkov sorriu.

— Quero comprar sua derrota. Três bilhões de dólares. Em paraísos fiscais. Isento de impostos. E um contrato vitalício com a federação como embaixador. Você nunca mais precisaria sangrar por ninguém.

Silêncio. Gabriel não se mexeu. Não mudou a expressão. Por dentro, sentiu repulsa. Como ousavam? Três bilhões eram muito... mas não eram suficientes para matar seu orgulho.

— Não sou compravel— respondeu ele.

Malkov caminhou lentamente até ele, servindo uísque para si mesmo.

— Não é sobre vender. É sobre entender o jogo. Você já venceu o mundo. Mas não vai vencer o tempo. Uma hora vai cair. Todos caem. Eu só estou te oferecendo controle sobre como será sua queda.

— Eu escolho cair de pé. E sozinho. — Gabriel se virou para sair.

Na noite anterior à luta, Gabriel participou de um evento social tradicional: a Cerimônia dos Titãs, um evento organizado em homenagem aos lutadores finalistas. Era algo simbólico, com discursos, entrevistas e um banquete luxuoso.

Gabriel odiava eventos assim. Mas a federação exigia sua presença. Usava um terno simples, evitava câmeras e ficou em silêncio o tempo todo. Era a sombra no salão. Até que ela apareceu.

Alta, pele morena suave, olhos castanhos dourados, cabelos pretos ondulados que caíam sobre os ombros como seda. Um vestido vermelho justo, sorriso sutil e elegância. O nome que ela deu era Lucía. Disseram que era filha de um diplomata espanhol e uma jornalista freelancer.

Ela se aproximou dele sem medo. Disparou perguntas rápidas, divertidas, e o desarmou com inteligência e charme. Gabriel, acostumado a afastar todos ao redor, pela primeira vez em muito tempo... relaxou.

Tomaram vinho juntos. Falaram de filosofia, de destino, de luta, de limites. Ela parecia entender sua mente — ou fingia muito bem. Quando o evento acabou, ela o seguiu até o elevador e ele não a afastou.

Na suíte do hotel, a conversa virou silêncio, o silêncio virou desejo.

Lucía foi tudo o que Gabriel nunca se permitiu ter.

Pela primeira vez em anos, ele dormiu com alguém... e dormiu profundamente.

Não viu quando ela se levantou.

Não sentiu quando ela injetou o líquido transparente no suco que ele tomaria no café da manhã.

Não percebeu que ela nunca foi jornalista.

Lucía era um fantasma pago por Malkov. E no mundo dos fantasmas, sentimentos são só parte do teatro.

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A manhã da luta chegou. Gabriel acordou estranho. Leve demais. Coração batendo mais lento que o normal. Visão turva.

Ele culpou o vinho. Mas o instinto o alertava — algo estava errado.

No vestiário, tentou aquecer, mas seus reflexos estavam atrasados. Músculos... preguiçosos. Sua mente estava afiada, mas seu corpo, não.

Quando entrou na arena, o rugido da multidão soou abafado. As luzes, mais fortes do que o normal. O ar, mais denso.

Dante Reaves estava lá, sorrindo. Jovem. Faminto. Preparado.

Gabriel... estava nu diante do abismo.

O primeiro round foi estranho. Ele ainda dominava, mas seus movimentos estavam levemente mais lentos. Dante se aproveitou, mas não conseguiu finalizar.

No segundo round, Gabriel sentiu as pernas tremerem.

No terceiro, veio o golpe.

Um cruzado de direita — perfeito. Direto na têmpora.

Um golpe que, em qualquer outro dia, Gabriel teria esquivado com os olhos fechados.

Mas naquele dia, dopado, vulnerável, aquele soco foi o fim.

O mundo girou, e Gabriel sentiu o brilho se apagar.

Ele caiu.

(Silêncio na arena).

O campeão invicto, o maior de todos os tempos...estava no chão.

Morto?

Não.

Mas... quase.

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No vestiário, os médicos confirmaram: parada cardíaca. Falência neurológica. Trauma craniano fatal.

Gabriel Monteiro, aos 36 anos, foi declarado morto em combate.

Oficialmente, foi um acidente. Um choque de titãs. Uma tragédia.

Mas entre os bastidores... Malkov sorria. Lucía desapareceu e o novo "rei" foi coroado.

Mas no vazio, no silêncio entre batidas do coração, uma voz grave ecoava...

"Você ainda não terminou. Seu limite está em outro lugar."

E então, tudo escureceu.

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