WebNovels

Chapter 6 - Aprendizado II.

Enquanto caminhava de volta para casa, minha mente fervilhava com perguntas e pensamentos que se entrelaçavam como fios de uma tapeçaria complexa. As palavras de Margareth ainda ecoavam em meus ouvidos — a história das artes arcanas, as divindades ancestrais que ensinaram os humanos, e principalmente o termo “Arquimago” com seu peso de desonra que ela carregava. Tudo isso se misturava ao suave som dos meus passos no caminho de pedras.

Da entrada da mansão de Margareth até o cavalo que nos aguardava do lado de fora dos portões ornamentados, meu pai, que caminhava silenciosamente ao meu lado, não me fez pergunta alguma. Talvez por ter notado minha inquietude, ele apenas me carregou em seus braços, respeitando meu silêncio, sem dizer uma palavra sequer.

Nossas residências eram consideravelmente distantes, talvez algo entre quatro e cinco quilômetros. Não sei precisar ao certo, mas tenho certeza que, da imponente casa de Margareth, era impossível avistar nossa modesta mansão de baronete.

Durante a viagem a cavalo, a brisa do anoitecer acariciava suavemente meu rosto. As árvores balançavam em uma dança lenta de um lado para o outro, e os pássaros entoavam uma melodia harmoniosa que preenchia o ar. “Talvez seja época de acasalamento?”, pensei, tentando distrair minha mente das revelações do dia.

Alguns minutos se passaram até que finalmente, no horizonte, pude avistar nossa casa. Não possuía o glamour ou a grandiosidade da mansão da minha mestra, mas emanava uma aura de acolhimento que me trazia paz imediata. À medida que nos aproximávamos, distingui a silhueta de minha mãe, que nos aguardava pacientemente à porta. Em seu colo, ela embalava minha irmã mais nova. “Será que Vivian não está com frio neste vento do entardecer?”, me perguntei com genuína preocupação.

Assim que chegamos, minha mãe nos recebeu com um daqueles sorrisos que parecem iluminar o mundo ao redor — doce e amoroso como apenas ela sabia oferecer.

— Elian, tudo bem? Como foi seu dia? — perguntou ela, com aquela voz melodiosa que sempre me acalmava.

Assenti com um sorriso e comecei a narrar os acontecimentos do dia, omitindo as partes mais perturbadoras sobre os perigos das artes arcanas e o título desonroso de Margareth.

Quando terminei meu relato simplificado, minha mãe, que até então embalava Vivian com ternura, anunciou que iria dar um banho em minha irmã. Restamos apenas eu e meu pai novamente, como no caminho de volta.

Ao adentrarmos nossa casa, ele, que até aquele momento havia respeitado meu silêncio contemplativo, repetiu a mesma pergunta que minha mãe:

— Como foi seu dia, Elian? — indagou, tentando soar casual, mas não conseguindo esconder completamente um toque de preocupação que brilhava em seus olhos atentos.

Decidi ser direto, pois algo em mim precisava compartilhar o que havia descoberto:

— Pai, a Mestra Margareth mencionou algo sobre os Arquimagos... E sobre uma espécie de título que ela carrega, que não parece ser algo respeitoso ou honroso... — Hesitei brevemente, incerto sobre quanto poderia revelar, mas prossegui. — Ela não explicou completamente o que aconteceu, mas insinuou que algum erro grave em seu passado a fez carregar esse título que parece ser de desonra.

Meu pai permaneceu em silêncio por um momento, seus olhos revelando pensamentos profundos, e então suspirou lentamente, como se já estivesse familiarizado com o que eu tentava compreender.

— Existem coisas, Elian, que o tempo não consegue apagar facilmente. O que Margareth fez no passado é algo que ficou gravado na memória de muitos. Quando o nome de alguém se entrelaça com tragédias maiores, torna-se quase impossível remover a sombra que isso projeta sobre a pessoa. — Ele fez uma pausa, escolhendo cuidadosamente suas próximas palavras. — Mas saiba disso, meu filho: a verdadeira honra não vem apenas do que é dito sobre nós, mas do que escolhemos fazer com o presente que nos é dado. A vida de qualquer pessoa, incluindo a de Margareth, não é definida apenas pelos erros do passado, mas pelas escolhas que fazemos a cada novo amanhecer.

Permaneci em silêncio, absorvendo a sabedoria contida em suas palavras. Em meio ao turbilhão de perguntas que me assolava, aquela resposta, embora enigmática, trazia um certo conforto. Compreendi que, assim como Margareth, eu também teria de fazer minhas próprias escolhas e decidir o que meu passado — qualquer que fosse — significaria para o futuro que ainda estava por construir.

— Como foi a aula em si? — meu pai perguntou, habilmente mudando o rumo da conversa.

Respirei profundamente e sorri, ainda com a mente repleta de pensamentos, mas não querendo preocupá-lo mais do que o necessário.

— Está começando a fazer sentido, pai. Creio que estou começando a compreender o que é essa energia arcana que permeia tudo... E a partir de amanhã, iniciarei aulas de meditação para entender melhor como perceber e canalizar essa energia.

Ele me retribuiu com um sorriso sereno, sem demonstrar qualquer dúvida sobre minha capacidade ou determinação.

— Sei que você aprenderá bem, Elian. Você sempre demonstrou força interior. Apenas não se esqueça de que o poder, por maior que seja, nunca é tudo. Saber quando e como utilizá-lo é o que verdadeiramente importa.

Ao adentrar mais profundamente em nossa casa, o silêncio acolhedor me envolveu como um manto familiar. O ambiente, simples e confortável, parecia agora mais reconfortante do que nunca após o dia de revelações. Enquanto me dirigia para meu quarto, meus olhos foram atraídos para a janela, onde o céu do entardecer estava tingido de um dourado intenso, como se a luz de um futuro promissor estivesse apenas começando a despontar no horizonte.

O caminho à minha frente ainda era nebuloso, repleto de incertezas, mas a partir daquele momento, o poder que eu buscava não seria apenas algo a ser dominado. Seria algo a ser compreendido com respeito, paciência e, quem sabe, com a sabedoria que Margareth ainda não estava pronta para compartilhar comigo.

Qualquer que fosse meu destino, eu estava determinado a seguir adiante.

★★★★★

No dia seguinte, ao chegar à mansão de Margareth, ela me entregou um livro antigo com ilustrações detalhadas de diversas posturas e posições que eu deveria praticar para aprimorar minha forma e concentração — elementos essenciais para sentir adequadamente a energia arcana.

— Elian, existem múltiplas formas de meditação. Você pode praticá-la sentado, deitado ou mesmo em pé, dependendo do que busca alcançar — explicou ela com voz didática.

Olhei para ela com uma expressão ligeiramente cética, pois esse conhecimento básico eu já possuía de minha vida anterior. Percebendo minha reação, ela prosseguiu com informações mais substantivas:

— A meditação é o primeiro passo fundamental para que você comece a perceber a energia arcana, que permeia tudo ao nosso redor de forma invisível mas onipresente. E é precisamente aí que reside o verdadeiro perigo.

Ela me observou atentamente por alguns segundos, como se avaliasse minha compreensão do que acabara de dizer. Satisfeita com minha atenção, continuou:

— Lembra-se do que lhe disse sobre não praticar isso em casa, sob hipótese alguma? — Assenti silenciosamente. — Quando você medita sem ainda compreender plenamente como a energia arcana flui e se comporta, é praticamente inevitável: você pode — e certamente vai — perder o controle em algum momento.

— O que exatamente acontece quando se perde o controle? — perguntei, sentindo um arrepio involuntário percorrer minha espinha.

— Chegarei a esse ponto em breve. — Ela removeu a luva que sempre usava com um movimento deliberadamente lento, revelando a runa que carregava gravada em sua mão esquerda: um triângulo sobreposto a outro, marcado permanentemente em sua pele. — A meditação serve primordialmente para alimentar essa runa que você também carrega, embora a sua tenha forma diferente.

Ela apontou para a estrela de seis pontas em minha própria mão.

— Sua runa é nutrida diretamente pela energia arcana que você consegue absorver e canalizar. Sua força arcana aumenta proporcionalmente à sua capacidade de absorver e processar essa energia. Mas aqui está o risco fundamental: se você não souber controlar com precisão a quantidade que absorve, essa energia transbordará para seu corpo físico. E quando isso acontece, se não houver alguém com conhecimento suficiente para interromper imediatamente esse fluxo descontrolado... você morre.

Ela fez uma pausa significativa, e então completou com voz grave:

— Ou, para ser mais precisa... você explode. Literalmente.

Ao ouvir aquelas palavras, senti o medo genuíno começar a se espalhar por meu corpo como gelo líquido. Foi naquele momento que compreendi verdadeiramente o quão perigoso seria tentar praticar sozinho. Sem refletir muito, perguntei a primeira coisa que me veio à mente:

— E meus pais? Eles não teriam capacidade para interromper o processo de absorção, caso algo desse errado?

Margareth balançou a cabeça com firmeza.

— Não, Elian. Por mais que seus pais tenham conhecimento das artes arcanas, eles estão apenas um nível acima do seu atual. Isso está muito aquém do necessário para conter uma falha de absorção grave como a que descrevi.

A propósito, estes são os níveis de poder arcano, conforme Margareth me explicou detalhadamente:

Ⅰ — Bruma

A alma adormecida.

O primeiro passo no caminho do despertar arcano. Alguns já sentem o chamado da energia, mas não possuem controle ou clareza sobre ela.

Runa: Dois riscos ondulados.

Ⅱ — Centelha (Meu nível atual)

O despertar inicial.

A Centelha anuncia potencial latente, mas ainda carece de direção e controle. Necessita impreterivelmente de um mestre para orientação e guia no uso adequado da energia.

Runa: Estrela de seis pontas.

Ⅲ — Chama (Nível dos meus pais)

A alma alimenta ativamente a Centelha.

Neste estágio, o arcanista começa a controlar conscientemente seu poder, e surgem os primeiros feitiços, selos e encantos básicos.

Runa: Uma chama.

Ⅳ — Rugido

Controle completo da energia e da absorção ambiental.

O poder se manifesta de forma inegável, tornando-se perceptível mesmo sem demonstração direta, como uma presença constante.

Runa: π (Pi).

Ⅴ — Tempestade

Conjuração e invocação que transcendem os limites físicos.

Neste nível, o arcanista pode desencadear destruição em larga escala — suficiente para arrasar cidades pequenas inteiras.

Runa: Um raio.

Ⅵ — Ascensão

A alma transcende completamente as limitações da carne.

O poder molda a realidade circundante conforme a vontade do arcanista, que pode reduzir metrópoles a escombros. Este é considerado o limite máximo que um ser humano pode alcançar.

Runa: Triângulo dentro de outro triângulo.

Ⅶ — Apex

O poder torna-se indistinguível da própria identidade do ser.

Vontade e milagre fundem-se em um único conceito. O ser ultrapassa definitivamente os limites da humanidade e é reverenciado como uma divindade encarnada.

Runa: Estrela de cinco pontas.

Ⅷ — Eterion

Conceito vivo e autônomo.

São os próprios pilares fundamentais da existência. Não caminham entre mortais, mas sua presença é sentida em todas as coisas. Tudo o que existe repousa sob sua realidade transcendental.

Runa: Símbolo do infinito (∞).

— Qual é o nível mínimo necessário para conseguir auxiliar alguém a controlar uma absorção descontrolada de energia? — perguntei, movido por curiosidade e ansiedade.

Margareth, sem demonstrar pressa, respondeu com a serenidade de quem já antecipava essa pergunta:

— Tempestade. — Seus olhos fixaram-se firmemente nos meus ao pronunciar o nome. — A cada mil Arcanistas que alcançam algum nível de poder, apenas dez conseguem chegar a esse patamar.

O número me surpreendeu profundamente. Minha mente analítica imediatamente calculou a proporção. Se já eram tão raros os que atingiam o nível Tempestade, então Ascensão deveria ser quase mítico em sua raridade.

— E para Ascensão...? — indaguei, minha voz quase um sussurro reverente.

Ela esboçou um sorriso sutil, com um toque de orgulho velado, como se já conhecesse o peso da resposta antes mesmo de verbalizá-la.

— A cada cem mil... apenas um. — declarou com simplicidade que contrastava com a magnitude da informação.

“Um em cem mil.” A frase reverberou em minha consciência como um trovão distante. Era uma proporção muito menor do que eu havia imaginado, mesmo em minhas estimativas mais conservadoras.

Meus pensamentos ainda processavam essa revelação quando decidi fazer outra pergunta crucial:

— Mestra... aproximadamente quantos Arcanistas despertam por ano?

Margareth levou a mão ao queixo em um gesto pensativo, refletindo brevemente antes de responder:

— Entre cem e cento e cinquenta, em média.

Meu rosto deve ter expressado o espanto que senti, pois ela reagiu à minha expressão.

— Isso... no reino inteiro? — questionei, achando o número surpreendentemente baixo.

Ela deixou escapar um sorriso divertido, negando suavemente com um movimento de cabeça.

— Não, Elian. A cada dez mil pessoas que despertam no nível Bruma, no máximo cento e cinquenta conseguem avançar para Centelha. E mesmo entre esses poucos afortunados, nem todos têm o privilégio de encontrar um mestre qualificado que os guie adequadamente. Muitos permanecem estagnados nesse nível... ou perecem na tentativa de avançar sem orientação.

A cada resposta que recebia, minha compreensão do mundo ao meu redor se transformava significativamente. Então, uma última dúvida surgiu em minha mente:

— Quantos habitantes possui o Reino de Malkuth atualmente? — perguntei, buscando contextualizar os números que ela me fornecia.

Margareth inspirou profundamente. Seu olhar pareceu perder-se momentaneamente em lembranças distantes, e sua expressão, antes serena, adquiriu uma sombra de tristeza.

— Cinco anos antes do seu nascimento, éramos aproximadamente cinco milhões de almas...

Ela fez uma pausa carregada de significado. Percebi que algo doloroso pesava naquela recordação específica.

— Então veio a guerra contra o reino vizinho. Perdemos muitas vidas... principalmente de inocentes, que jamais deveriam ter sido envolvidos naquele conflito. — Sua voz soou mais baixa, como se cada palavra carregasse o peso das mortes que mencionava.

Um silêncio respeitoso pairou entre nós por alguns segundos.

— Já discutimos teoria suficiente por hoje. Hora de iniciar a prática. — declarou, reassumindo sua postura de mestra firme e exigente.

Após aquela conversa reveladora, comecei meus exercícios práticos. Margareth me orientou a sentar sobre um tecido grosso e macio estendido no chão de madeira polida. O ambiente era despojado de ornamentos desnecessários, mas o aroma suave das ervas e incensos que ela mantinha constantemente acesos criava uma atmosfera propícia ao relaxamento e concentração.

— Lembre-se: não force sua respiração, apenas observe e acompanhe seu fluxo natural — instruiu ela, com voz simultaneamente paciente e firme.

Fechei os olhos e permiti que o ar preenchesse meus pulmões em um ritmo cadenciado, enquanto tentava acalmar a tempestade de pensamentos que ainda ecoavam em minha mente sobre tudo o que acabara de aprender. A ideia de que meu próprio corpo poderia não suportar a energia arcana e literalmente explodir me causava inquietação, mas eu sabia que precisava transcender esse medo para progredir.

Gradualmente, comecei a perceber uma sensação sutil e incomum... como se algo intangível tocasse minha pele por dentro, uma vibração quase imperceptível que parecia emanar de tudo ao meu redor. Era uma presença tênue, mas inegavelmente real — como se o próprio mundo estivesse tentando comunicar-se comigo, e eu, ainda inexperiente, mal conseguisse interpretar sua linguagem.

— Concentre-se nessa sensação — orientou Margareth, sentada silenciosamente próxima a mim. — Não tente capturá-la ou controlá-la ainda. Apenas observe e sinta sua presença.

O tempo transcorreu, e minha mente, antes agitada, começou a clarear. O ambiente ao redor parecia dissolver-se gradualmente. Os sons externos foram se atenuando — o crepitar da lenha na lareira, o assobio do vento nas janelas — até que restasse apenas aquela vibração sutil, dançando ao meu redor e através de mim.

Subitamente, essa sensação começou a intensificar-se. Meu corpo experimentou uma estranha transformação, como se estivesse expandindo-se internamente. Uma onda de calor ascendeu do centro do meu peito para os ombros, e senti minhas mãos formigarem intensamente, especialmente a esquerda, onde a runa estava gravada.

— Pare. Imediatamente! — A voz autoritária de Margareth me trouxe abruptamente de volta à realidade.

Abri os olhos, respirando ofegante, e notei que a runa em minha mão esquerda emitia um brilho âmbar suave mas visível. Uma dor latejante pulsava em minhas têmporas, embora fosse tolerável.

— Você absorveu mais energia do que deveria — observou ela, examinando atentamente a runa em minha pele. — Isso é perfeitamente normal nos estágios iniciais do treinamento. Por sorte, você interrompeu o processo a tempo.

Deitei-me no chão, exausto como se tivesse corrido por horas, enquanto sentia gotas de suor escorrerem por minha testa. Margareth aproximou-se e pousou a mão em meu ombro com um gesto quase maternal, seu tom de voz suavizando-se consideravelmente:

— Hoje você fez um progresso notável, Elian. Não seja tão severo consigo mesmo. Este caminho exige tempo e paciência. E tempo, felizmente, é algo que temos em abundância.

Fechei os olhos novamente, sentindo o alívio de ter superado com sucesso meu primeiro contato real com o perigo das artes arcanas. No fundo, eu sabia que aquele era apenas o primeiro de muitos desafios que me aguardavam na jornada que acabava de começar.

More Chapters